Por 6 votos a 4, o governador Carlos Moisés da Silva (PSL) foi absolvido da acusação de crime de responsabilidade na compra fraudulenta dos 200 respiradores não entregues pela empresa Veigamed. A sentença foi proferida na tarde desta sexta-feira (7) pelo Tribunal Especial de Julgamento, em sessão realizada por meio de videoconferência.
Com a decisão, o processo de impeachment de Moisés no caso dos respiradores foi concluído. O governador retornará ao comando do Estado ainda nesta sexta-feira. Ele estava afastado do cargo desde 30 de março.
O resultado foi proclamado pelo desembargador Ricardo Roesler, presidente do tribunal, às 14h15, após cinco horas de sessão. Ao final, o magistrado agradeceu a todos os envolvidos no julgamento. “O momento reclama mais uma vez comprometimento. É obrigação de todos para com a sociedade catarinense”, afirmou.
O placar do julgamento repetiu a votação registrada na sessão de análise da denúncia, no dia 26 de março, quando Moisés foi afastado do cargo. Os cinco desembargadores votaram pela condenação. Entre os deputados, apenas Laércio Schuster (PSB) não votou pela absolvição.
Os magistrados entenderam que havia provas para responsabilizar administrativamente o governador, mesmo que investigações em outras esferas tenham sido arquivadas. Já os parlamentares, em sua maioria, entenderam que o arquivamento da investigação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de manifestações da Polícia Federal (PF) e Tribunal de Contas do Estado (TCE) pela não responsabilidade do governador, era motivo suficiente para a absolvição.
DEBATES - Primeiro julgador a se manifestar, a desembargadora Sônia Maria Schmidt afirmou que o fato da investigação sobre a participação de Moisés no âmbito criminal ter sido arquivada não interfere no processo de impeachment.
“A rede de indícios formada por diversos elementos apresentados nestes autos consegue por si só evidenciar o conhecimento do denunciado a cerca da negociação e também sua omissão em relação ao emprego ilícito do dinheiro público, o que é suficiente para a responsabilização”, destacou a desembargadora.
Na sequência, o deputado Marcos Vieira (PSDB) ressaltou que Ministério Público Estadual (MPSC), Ministério Público Federal (MPF), TCE, PF e STJ afastaram a possibilidade de participação direta de Moisés na compra dos respiradores.
Para o deputado, não há indícios mínimos, além da flagrante falta de provas, do envolvimento direto do governador. “Índicios e omissão são muito subjetivos. Será que esse suposto crime de omissão é tão grave que possa levar à cassação de um governador?”, disse. “Não posso, nesse momento, de uma hora para outra substituir um governador por um suposto crime, o qual eu não reconheço.”
O desembargador Roberto Lucas Pacheco, o terceiro a se manifestar, fez um retrospecto de fatos que indicariam a responsabilidade do governador, como a participação de Moisés em entrevistas sobre a compra de respiradores e a apresentação de projeto de lei que autorizaria o Estado a fazer aquisições com pagamento antecipado.
“Está suficientemente demonstrado que o governador tinha ciência e nada fez para evitar [a compra]”, declarou Pacheco. “Sobre a autoria, ao meu sentir, a prova produzida dá conta que o governador tinha conhecimento.”
Quarto julgador a discutir, o deputado José Milton Scheffer (PP) destacou que o impeachment, por ser um juízo político-jurídico, abre margem subjetiva para o julgamento. Ele também destacou o arquivamento das investigações contra o governador na esfera criminal.
“Este caso foi investigado pelos órgãos mais competentes que temos no país e todos apontam na mesma direção, que não há indícios suficientes para a condenação do governador”, declarou. Para ele, a cassação de Moisés “desestabilizará a estrutura estatal, num momento em que precisamos nos fortalecer.”
O desembargador Luiz Zenelato deu prosseguimento aos debates. O magistrado reforçou que as decisões na esfera criminal não interferem no julgamento por responsabilidade política. Para ele, Moisés tinha o dever jurídico de impedir a compra fraudulenta dos respiradores, mas não o fez.
“Ainda que o governador não tenha determinado a despesa, o conjunto probatório dos atos é fato e eloquente a indicar que ele possuía conhecimento do negócio firmado e das condições precárias, e tinha o dever jurídico de tomar todas as providências necessárias para evitar o procedimento danoso”, concluiu.
O deputado Valdir Cobalchini (MDB), sexto a se manifestar, considerou que o processo de impeachment “carece de alicerce mínimo de condições, porquanto ausente o requisito primário da justa causa” para a condenação de Moises. Ao citar frase imputadas a Santo Agostinho e Jesus Cristo, considerou o governador inocente das acusações de crime de responsabilidade.
A desembargadora Rosane Wolff, que foi a relatora da denúncia no tribunal, reforçou que a CPI dos Respiradores da Alesc colheu elementos que não foram refutados pela defesa e são suficientes para demonstrar a responsabilidade do governador. Para ela, Moisés não zelou pelo erário público e demorou para tomar providências a respeito da irregularidade
“[Moisés] demostrou ter conhecimento da negociação. Não agiu criminalmente, nem criminosamente em conluio com os fraudadores, mas tinha conhecimento da contratação e do pagamento antecipado sem garantias”, afirmou. “É inquestionável que ele tinha participação direta nas ações contra a pandemia.”
Rosane também considerou que as decisões na esfera criminal não interferem no impeachment. Afirmou, ainda, que mesmo que Moisés tivesse agido por ingenuidade, ao permitir a compra dos respiradores, deveria ser responsabilizado. “A ingenuidade não se coaduna com a função da magistratura e sequer se coaduna com o chefe do poder executivo de um estado.”
VOTO DECISIVO - Coube ao deputado Fabiano da Luz (PT) dar o voto decisivo para o julgamento. Ele também destacou que as investigações sobre Moisés na esfera criminal foram arquivadas. “Não há como negar que as decisões de uma refletem ou deveriam refletir nas conclusões da outra”, disse.
Para o parlamentar, não havia prova irrefutável para a responsabilização do governador. Diante disso, para Fabiano, a presunção da inocência é um princípio basilar do ordenamento jurídico e do estado democrático de direito
O placar pela absolvição já estava definido quando do desembargador Luiz Antônio Fornerolli se manifestou pela condenação. Ele insistiu na independência das instâncias de julgamento e, falando diretamente aos colegas magistrados, considerou que “não há porque sermos constrangidos porque se formou outra opinião em Brasília, passível de mutação”, referindo-se ao arquivamento da investigação sobre Moisés no STJ.
O julgador afirmou ter plena convicção nas provas apontadas no processo de impeachment para a condenação do governador. “Respeito os entendimentos divergentes, mas há um aporte de provas suficientes, sobre o qual não resta qualquer resquício de dúvida processual”, declarou.
Laércio Schuster foi o último julgador se manifestar. Ele criticou o fato dos demais deputados insistirem em relacionar as investigações criminais com o processo de impeachment. “Os desembargadores estão tentando mostrar que uma coisa não tem a ver com a outra.
Misturar as duas coisas é subestimar a nossa inteligência e visa confundir a opinião pública catarinense”, comentou.
Único parlamentar que votou pela condenação de Moisés, Schuster considerou que as consequências da compra fraudulenta foram gravíssimas para a população catarinense, principalmente com as vítimas da Covid. “Não pertenço a esse tipo de classe política”, disse.
Marcelo Espinoza
FOTO: Daniel Conzi